O Caracol - XVIII | Primavera 2025
18 min leitura

O Caracol - XVIII | Primavera 2025

Nesta edição, envolta no desafiante tema da inteligência artificial, podem acompanhar o que se está a passar na Rede bem como explorar artigos dos nossos membros e de convidados especiais, numa Newsletter recém-renovada. 

Não é demais lembrar… Participem! Façam parte do Caracol enviando para comunicacao@decrescimento.pt informações relevantes que desejem compartilhar com a comunidade; eventos promovidos, incluindo o seu conteúdo; iniciativas futuras a divulgar, petições, apelos, artigos e sugestões.

ÍNDICE

1 - Ações da Rede e dos seus Membros

2 - Agenda da Rede

3 - Eventos externos em destaque

4 - Dar a Palavra

5 - Novidades do Site

6 - Publicações de interesse para a comunidade decrescentista

1- Acções da Rede e dos seus membros

 

1.1 Rede

Reunião conjunta dos círculos de Gestão Interna e de Comunicação, em 1 de Abril de 2025

Uma vez que houve alteração nas equipas de ambos os círculos, esta reunião era premente. Foram concertadas actividades e formas de agir, dentro e fora da Rede.

Oficina “Decrescimento à escala local”, dia 10 de Abril de 2025

Com eleições autárquicas previstas para este ano, a Rede para o Decrescimento, através do seu círculo Autarquias e Decrescimento, está a promover um processo de reflexão sobre o decrescimento à escala local. O objectivo central é colocar o decrescimento nas agendas públicas, estimular a reflexão sobre medidas que podem ser tomadas a nível local e disponibilizar informação sobre o que está já a acontecer, seja no nosso país ou noutras partes do mundo. 

Entre as iniciativas deste círculo, está a elaboração de um glossário sobre o tema, com propostas de medidas e de políticas e também com exemplos que ilustram a sua possibilidade e links que facilitam o aprofundamento destas questões a qualquer pessoa interessada. Esta oficina é um contributo para o aprofundamento do debate, de forma participada. A territorialização das perspectivas decrescentistas e a tradução do decrescimento em políticas locais foram algumas das questões que estiveram no cerne do debate. O grupo trabalhou em salas simultâneas e centrou-se em 3 temas: (i) economia de base local, (ii) bens comuns e (iii) educação, cultura e democracia criando um padlet coletivamente.

No encerramento, os e as participantes reforçaram o interesse em dar continuidade a este trabalho. Perspectivamos a realização de uma nova oficina no final de Junho.

Foto: Reyhaneh Alikhani, Contextile 2022, Guimarães

4º Encontro do Núcleo local de Lisboa, na Horta do Alto da Beira, em 12 de Abril de 2025

O NL de Lisboa visitou a Associação Regador e o seu projecto de horta comunitária no Alto da Eira, na freguesia da Penha de França. Pelas 10h30 iniciou-se um passeio pela horta guiado pelo Paulo e pela Maria, ambos na coordenação do projecto. A conversa desenrolou-se à volta da ideia e do processo de construção da horta que conta com a ajuda voluntária de todos: membros da associação, vizinhos ou simples interessados. Alinhada com as propostas de Decrescimento, a Associação Regador tem conseguido promover a equidade, produção e consumo local, autossuficiência energética e o bem-estar da comunidade, partilhando os produtos da horta e boa disposição. 

Os membros da Rede ajudaram na preparação de composto (para colocar nos talhões) e nos plantios de Primavera (tomate, beringela, courgette e pimento), que constituíram as principais actividades dos encontros semanais abertos, que ali decorrem todos os sábados de manhã (Sábados em Comunidade). Pudemos constatar que se trata de um óptimo exemplo de como se podem utilizar interstícios disponíveis no tecido urbano da cidade para promover espírito de comunidade e de entreajuda. A habitual reunião teve lugar ao almoço, cerca das 13h30, tendo o bom tempo ajudado a contribuir para este evento. Esperamos voltar ao Alto da Eira em breve!                     

Breve enquadramento decrescentista - Este projecto contribui para o aumento da qualidade de vida, para a criação de ambientes mais limpos, mais resilientes, promove a agricultura urbana como meio de combate às alterações climáticas, impulsiona mais biodiversidade na cidade, reaproxima o campo à urbe, promovendo alimentação saudável e trabalho comunitário, envolve transversalmente todas as redes de parceiros locais tais como associações, escolas, etc… Fortalece uma consciência comum informada das apreensões existentes, das prioridades, propostas e acções a desenvolver, com base na qual cada cidadão pode e deve participar, dando satisfação à paixão ou vocação agrícola, e aproximando vizinhos. Situação urbana - A horta com configuração rectangular, fica em Lisboa e tem o seu lado menor na Avenida General Roçadas, desenvolve-se em socalcos virados a nascente ao longo da Rua Frei Manuel do Cenáculo, a norte em contiguidade está a Vila Cândida, a nascente a entrada. Estão assegurados níveis de estabilidade, de controlo da erosão e de protecção do solo, consolidando os sistemas de vegetação, de relevo e da circulação da água, preservando a sua integridade enquanto pequena unidade paisagística.

Conclusões - Óptimo exemplo de como se podem utilizar interstícios pequenos e disponíveis no tecido urbano da cidade, criando-se locais de excelência, de partilha e de convívio.

5º Encontro do Núcleo local de Lisboa, no ISCTE, em 15 de Maio de 2025

O local escolhido para a reunião mensal do núcleo prende-se com a conferência dada por Vasilis Kostakis (Professor de Governança Tecnológica e Sustentabilidade na Universidade de Tecnologia de Tallinn e Professor Associado na Universidade de Harvard), com o título "Beyond Techno-Optimism - Reconciling Innovation with Environmental Justice", a qual teve lugar pelas 18h no auditório 302 do ISCTE.

Na reunião foi, sobretudo, feita uma calendarização dos eventos seguintes, bem como convidados a participar. Houve ainda a proposta de se organizar um evento para debater o colapso dos sistemas, uma vez que se começa a perceber que estes estão a estalar, sendo necessário um exercício colectivo de percepção.

Na Conferência, Vasilis Kostakis baseou a apresentação na possibilidade ou não de reconciliação da inovação com justiça ambiental global; do crescimento verde; e do ecomodernismo. Será a competição o caminho para a inovação? Por outro lado, existe uma mid-tech entre a pouco-acessível e caríssima alta tecnologia e a baixa tecnologia, recorrendo nomeadamente a open sources, à proximidade, à produção local de desenhos globais, ou a materiais baratos. O autor termina com exemplos felizes de aldeias gregas, onde está envolvido, antes de abrir o debate com a plateia.

Reunião Geral da Rede, na Casa Branca em Montemor-o-Novo, a 24 de Maio de 2025

No dia, viajaram de comboio para Casa Branca a Ana, o João, o Jorge e o Hans. Juntou-se à viagem o André, respondendo a um convite do Álvaro na conferência de Vasilis Kostakis. No mesmo comboio viajaram também a Sofia e o Jared, dois artistas cujo trabalho se tem focado nos limites do planeta.

À chegada esperavam-nos a Xana, o Manuel da Estação Cooperativa e uma convidada, o Rui da Cooperativa Coopérnico e um amigo.  Visitámos o espaço e os vários edifícios (recuperados e por recuperar), acompanhados pela narrativa da Xana que nos descreveu como surgiu a ideia, os principais desafios e dificuldades que têm encontrado, mas também as conquistas e parcerias que têm conseguido desde 2021, altura em que o espaço lhes foi concessionado. A cooperativa tem como objectivo a “ocupação e requalificação de diversos edifícios associados à estação ferroviária, bem como os espaços exteriores contíguos, através da implantação de uma comunidade criativa e experimental, em simbiose com as necessidades locais e com os desafios emergentes do Planeta”, envolvendo a população, promovendo a ideia de gestão comunitária do património público abandonado. Neste momento albergam a residência de um grupo de estudantes de arquitectura do estúdio BASEhabitat da Universidade de Arte e Design de Linz, que utiliza o espaço como laboratório de aprendizagem de técnicas tradicionais. O espaço convida ao passeio e alimentou-nos a curiosidade.

Decorreu uma conversa sobre a Cooperativa de Energia Coopérnico, que tem como preocupação a Democracia Energética, e como missão envolver os cidadãos e empresas na criação do novo paradigma energético, renovável e descentralizado, em benefício da sociedade e do meio ambiente. O Rui explicou de forma sucinta e clara o papel e importância das cooperativas e comunidades de energia e da sua conexão em rede. Lançou o desafio de pensar como chegar às populações que mais podem beneficiar com esta alternativa a um sistema centralizado, como forma de criar emprego verde a nível local e de promover a transição para uma economia mais sustentável. Seguiu-se o almoço no restaurante Casa Branca onde pudemos apreciar a gastronomia local de forma convivial (e farta!).

À tarde, teve lugar a Reunião Geral (RG). 1 - Iniciou com uma actividade proposta pelo João sobre como cada um dos participantes está a “decrescer”. Acções individuais e colectivas foram escritas em pequenos círculos e caracóis de cartolina colorida e coladas na parede em círculo. Após a sua leitura, ligámos as nossas acções, formando assim uma rede para o Decrescimento. 2 - Foi abordado o tema do Open Collective e a forma como pode ser gerido o dinheiro da rede. Foi proposto que os pedidos passem pelo CGes para verificação, divulgação e concordância dos restantes membros da rede. Foi também sugerida a utilização de parte da verba para a dinamização e divulgação regular de eventos relacionados com o Decrescimento. 3 - Atendendo ao desafio proposto à RD por uma empresa portuguesa de eventos, que quer transformar a sua própria forma de trabalhar, no sentido de promovermos em 2027 a Conferência Internacional de Decrescimento, foi decidido avançar com uma carta de intenções. Hans Eickhoff, João Wemans, Guilherme Seródio e Graça Rojão irão elaborar texto a ser enviado até 31 de maio, data limite. 4 - Foi abordada a intenção de organizar um futuro evento sobre Decrescimento e Colapso, tendo o Guilherme e o Hans ficado encarregues de dar desenvolvimento. Cerca das 16h45, terminámos a reunião, com o desejo de voltar à Casa Branca.

Candidatura à Conferência Internacional do Decrescimento - 2027

“Territórios de transformação intersticial: práticas de decrescimento para uma civilização em colapso” é o tema escolhido pela candidatura à realização em Portugal da Conferência Internacional do Decrescimento - 2027. A parceria que a Rede para o Decrescimento integrou, reúne pessoas ligadas ao activismo, à academia, aos movimentos sociais e à intervenção social, que uniram esforços com a agência de eventos portuguesa THE - The House of Events. A proposta apresentada visa levar a conferência até à Covilhã, uma cidade periférica face ao Centro Europeu e também no contexto português, e reforçar os processos cocriativos entre organizações, linguagens e repertórios de luta. A iniciativa pretende estimular a imaginação de futuros alternativos e abrir espaço para formas de expressão diversas, num processo de polinização cruzada, capaz de constituir um fermento da criação ou reforço de alianças.

Dia Global do Decrescimento, no ISEG, em 7 de Junho de 2025

O Núcleo local de Lisboa em conjunto com o ISEG quiseram assinalar esta data, mundialmente celebrada todos os anos no primeiro sábado de Junho (ver outros eventos públicos aqui), a qual visa partilhar alternativas a uma sociedade baseada no crescimento económico e na destruição social e ambiental, tendo para isso organizado um programa com três momentos distintos mas muito convidativos. De manhã, por volta das 10:30, teve lugar a Conversa “O Mito da Poupança de Tempo: Mobilidade, Cidade e Qualidade de Vida”, com moderação de Patrícia Melo e Hans Eickhoff. A forma como nos deslocamos nas cidades não é neutra: reflete visões sobre o que é o progresso e o bem-estar. Durante décadas, os investimentos em transportes foram guiados por uma lógica de eficiência centrada na velocidade e na minimização do tempo de viagem. Esta visão utilitarista, focalizada na promessa de reduzir os tempos de deslocação, não só falhou em concretizar uma poupança efetiva de tempo para as pessoas, como contribuiu para transformações estruturais no território que favoreceram uma maior dispersão urbana, aumentaram a dependência do automóvel e agravaram as desigualdades no acesso a oportunidades sociais e económicas. Nesta conversa, falou-se sobre a trajetória do modelo de desenvolvimento urbano na Área Metropolitana de Lisboa, com especial atenção ao seu enraizamento na lógica rodoviária, e explorar visões alternativas para uma reorganização pós-automóvel do território.

Depois da conversa, por volta do meio-dia, foi a vez de visitar a mini-floresta do ISEG, seguindo-se um almoço piquenique aberto. 

Sessões de Acolhimento

O Círculo de Acolhimento tem programado momentos online mensais para quem queira aprofundar o seu envolvimento com o nosso colectivo ou saber um pouco mais sobre a Rede. As próximas serão: 26 de Junho e 31 de Julho. Link para entrar nas reuniões: https://meet.jit.si/CircAcolhimentoRedeDecrescimento

1.2 Membros

Clube do Livro Vozes 2024/2025, na Casa do Comum, em 7 de Junho de 2025

A última sessão do ciclo ‘Vozes para Adiar o Fim do Mundo’ do clube de leitura promovido pela Ana Luísa Silva (membro da Rede) e Ana Sofia Souto, com colaboração do Álvaro Fonseca da Rede, decorreu na tarde do dia 7 de Junho na Casa do Comum, em Lisboa. O livro escolhido para essa sessão foi a obra seminal de Rachel Carson ‘Primavera Silenciosa’. Nele a autora tece uma crítica incisiva e fundamentada à indústria agroquímica e ao uso indiscriminado de pesticidas sintéticos, em particular o DDT, devido aos seus múltiplos impactos ambientais. Durante a conversa foi destacado o papel da obra de Carson na consciencialização sobre as questões ecológicas e na fundação do movimento ambiental internacional, mas também o facto de, 63 anos após a sua publicação, manter actualidade e pertinência perante o agravamento da crise ambiental global, para a qual tem contribuído a intensificação do modelo agrícola industrial baseado em monoculturas e agroquímicos. Outro aspecto que surgiu na conversa entre os presentes foi o interessante paralelismo entre a visão crítica de Carson e a crítica ao sistema económico hegemónico feita pelos decrescentistas, na medida em que ambas enfatizam os impactos nefastos das práticas industriais e económicas descontroladas no ambiente e na saúde humana. Carson destacou o uso excessivo de pesticidas e os seus efeitos nocivos para os ecossistemas e para a saúde humana, defendendo que estes químicos se acumulam na cadeia alimentar e representam riscos significativos, sempre minimizados pela indústria química. Da mesma forma, os estudiosos do decrescimento criticam a busca incessante pelo crescimento económico, que leva à degradação ambiental, ao esgotamento dos recursos e à desigualdade social. Tanto Carson como os decrescentistas defendem uma reestruturação fundamental das normas e práticas sociais e económicas. Carson propôs um regresso a práticas agrícolas mais sustentáveis, enfatizando a importância do equilíbrio ecológico e de mitigar as consequências a longo prazo da utilização de produtos químicos. Os académicos do decrescimento defendem também uma reorganização radical dos sistemas económicos e sociais para priorizar o bem-estar social e ecológico em detrimento dos lucros das empresas e do consumo excessivo. Este tema será desenvolvido num artigo de fundo a publicar separadamente.

Piquenique Kitchen Cheeks, em 7 de Junho, no Porto

O Núcleo do Norte participou no mega piquenique vegan da  kitchencheeks.com, por ocasião da celebração do Dia Internacional do Decrescimento. Com o mote “We are Picnic – coming together to celebrate the end of capitalism”, foi feito o convite a todos quantos se quiseram juntar, desacelerar e passar um bom bocado enquanto acto de rebelião face aos imperativos do crescimento económico à nossa sociedade.

Dia Global do Decrescimento, na Covilhã, dia 7 de Junho

No Dia Global do Decrescimento, a Graça, membro da Rede e a cooperativa CooLabora realizaram na Covilhã uma edição da Feira Troca-a -Tod@s, cuja moeda social é o tear, pondo em prática princípios do decrescimento. A iniciativa juntou produtores e produtoras locais, que levaram pão e bolos caseiros, frutas, hortícolas, artesanato, etc. Houve ainda uma banca dedicada à troca directa de livros e várias outras de venda (na moeda da feira) de produtos que esperam por uma segunda vida, especialmente roupa e brinquedos. Não faltou animação, com oficinas de fiação de lã, danças tradicionais ou cosméticos artesanais. No final, a música equatoriana e as danças bolivianas fecharam a iniciativa em festa.

Feira Troca-a-To@s, Junho 2025

1.3 Núcleos e Círculos na Rede 

Núcleo do Norte

Foi com muito gosto que a Rede viu surgir um novo polo para divulgação dos ideais decrescentistas, o qual agrega membros do Porto e outras regiões nortenhas. A primeira reunião teve lugar a 20 de Março, sendo já muitas as acções a que se propõe.

2 - Agenda da Rede

23 de Junho, 6º Encontro do NL Lisboa, no exterior do edifício do ISEG. Inicia-se com uma reunião de núcleo às 17h, seguido da assistência ao Seminário “Slow Down or Perish: The Economics of Degrowth”, agendado para as 18h, no anfiteatro 24 do ISEG, com Timothée Parrique e outros discursantes.

12 de Julho, Encontro das Beiras pela Justiça Climática, na CooLabora (Covilhã)

Este encontro é co-organizado pela Rede para o Decrescimento, em parceria com entidades locais da região da serra da Estrela como a Ação Floresta Viva, CooLabora, MiningWatch Portugal/Observatório dos Recursos Naturais e Veredas da Estrela e constitui um evento descentralizado, no seguimento do Encontro Nacional pela Justiça Climática.

3 - Eventos externos em destaque

23 de Junho, Assembleia Beyond Growth no Parlamento Norueguês, Oslo

23 de Junho, 6ª Conferência Internacional do Movimento de Decrescimento

24 de Junho, lançamento do livro “Abrandar ou Morrer” de Timothée Parrique, no Âmbito Cultural do El Corte Inglês, pelas 18:30h. Todo o programa sobre a estadia e participações do autor em Portugal pode ser consultado aqui.

24 a 27 de Junho, Conferência ISEE-Degrowth 2025, em Oslo, Noruega. É organizada conjuntamente enquanto 18ª Conferência da Sociedade Internacional de Economia Ecológica e 11ª Conferência Internacional de Decrescimento

4 - Dar a Palavra

4.1 Inteligência Artificial vs Humanidade Criativa, por Paulo de Mendonça

Se perguntarmos ao ChatGPT qual o impacto da Inteligência Artificial (IA) na criatividade, ele responde-nos (sorridente, parece-me) com uma lista de impactos positivos, mas num tom mais sério, reconhece que existem riscos e desafios, como estes:

A homogeneização: Como a IA é treinada com base em dados existentes, ela pode reproduzir padrões já vistos, levando à repetição e à falta de inovação real.

Questões de ética e de autoria: Quem é o autor de uma obra feita com IA? O humano, a IA ou ambos? Isso levanta debates legais e morais.

Dependência criativa: Pode haver um risco de os criadores dependerem demais da IA, perdendo confiança ou capacidade de criação autónoma.

Desvalorização do trabalho artístico: Quando a IA gera conteúdo em segundos, o valor percebido de uma obra feita por humanos pode diminuir — especialmente em mercados comerciais.

 E remata com “A IA, longe de ser um “substituto” da criatividade, pode ser uma parceira criativa poderosa — quando bem usada. Claro que o toque humano ainda é insubstituível na emoção, intenção e visão.”

 Mas será mesmo insubstituível?

Peguemos por exemplo no Assistente Virtual de IA Claude 3.7, que permite gerar ideias originais de enredo e conceitos de mundos, tramas, narrativas complexas; escrever, rever e editar em vários estilos, e ainda nos dá uma análise de tendências de mercado e comparações com autores consagrados! Ora, sabendo nós que existem outras ferramentas semelhantes para as artes visuais, as artes performativas e a música, se pegarmos na certeza do GPT de que o toque humano é insubstituível, a pergunta inevitável é: até quando?

 A IA começou a ser desenvolvida na década de 40, e o termo surgiu numa conferência de cientistas em 1956. Até aos anos 90 passou por uma série de avanços e recuos, mas com um aumento do financiamento à pesquisa e, já neste século, com os avanços tecnológicos sobretudo ao nível dos algoritmos, a IA passou a ser parte das vidas de todos em todas as situações, mesmo naquelas que não percebemos. O objectivo foi sempre colocar máquinas a raciocinar, aprender e actuar em situações que exigiriam inteligência humana a uma escala imensa ou o estudo de dados numa dimensão muito maior do que pessoas poderiam analisar.

Ou seja, a IA serviria para desempenhar as tarefas massivas, maçudas, chatas e repetitivas, deixando para as pessoas o trabalho e as funções empáticas, cuidadosas, de liderança, criativas. No fundo, o mesmo propósito que conduziu a todos os desenvolvimentos tecnológicos, desde a invenção da roda. Então porquê e a partir de que momento achámos que a IA seria uma boa opção para as tarefas criativas?

A partir de que momento aceitámos que aquilo que nos distinguia das máquinas e do pensamento artificialmente gerado, poderia ser trocado por um mundo ilimitado de novidade, inovação, criação, criatividade? Quando é que decidimos abdicar de sermos humanos?

Humanos que erram, que falham, que se enganam, que são repreendidos, que aprendem com os seus erros e a viver com eles e que tentam uma e outra, e outra vez até obter o melhor resultado, resultado esse que reflecte sempre a nossa humanidade. Em que momento abdicámos desse desígnio, que é também responsabilidade, e a entregámos a uma entidade incorpórea, abstracta, invisível e naturalmente ilibada? Procurámos com essa rendição ser mais produtivos em menor tempo e com menor esforço? Assumirmos a nossa preguiça para ganhar tempo de lazer? Ou, a reboque da tendência das sociedades modernas – sobretudo as digitais - furtarmo-nos às nossas responsabilidades, delegando-as nas máquinas?

Desde que a informatização e digitalização dos processos de trabalho, da administração pública e das comunicações inter-humanas se estabeleceram nas nossa vidas, usamos as “falhas do sistema” como desculpa para as nossas próprias falhas, para as nossas incoerências, para as nossas humanas incompetências. Antes disso procurávamos justificação nos actos e omissões dos outros, nas indisposições nocturnas, no Sol que teimava em não brilhar, em Mercúrio retrógrado ou no cão que comeu o trabalho de casa. É humano! Tão humano como errar, é tentar justificar o erro. Mas com a IA não há como errar! A IA, sendo perfeita na sua essência, é a justificação absoluta de todo e qualquer acto da nossa existência, incluindo o acto criativo! Em última instância não estaremos a usar as ferramentas da IA pelo medo de falhar, o medo de ser escrutinado, o medo da repreensão dos nossos pares perante o nosso tão humano erro? Só que quem não erra não aprende e não evolui e, ironicamente, a própria IA aprende e aprimora as suas respostas através dos nossos erros, das nossas falhas, dos nossos processos de constante readaptação e aprendizagem. Processos esses que também estamos a negligenciar e a terceirizar nessa entidade imaterial e intangível que é tudo, mas que verdadeiramente, sem nós, não é nada.

E o NÓS é o fulcro desta questão. É a quintessência da humanidade e do impacto que esta tem sobre os outros companheiros do reino animal, vegetal ou mineral. Da ecologia holística e de tudo o que explica e justifica a existência deste flutuante globo espacial a que chamamos Terra. Desde a origem ao Homo Sapiens, foram sendo utilizadas as características intelectuais disponíveis adaptadas às circunstâncias, que permitiram a evolução da espécie até ao que somos hoje. Nunca como agora tivemos tanto saber e tanto conhecimento disponível, mas também, nunca como agora tivemos tanta discrepância entre informação e conhecimento. O que fazemos com o que sabemos é cada vez mais condicionado pela nossa falta de vontade de questionar, escrutinar, filtrar, ser criterioso. Se tudo nos é apresentado como produto final, porquê darmo-nos ao trabalho de manufacturar, pensar, criar?

Sem conseguir apresentar quaisquer respostas, acumulamos interrogações, mas sabemos que da “dúvida nasce a luz” e se “penso, logo existo”, portanto algo de crucial sabemos: É fundamental continuarmos a pensar para existir e pensar é por si só um acto criativo, logo, criando existimos. E não podemos delegar a nossa existência em algo que por definição não existe, algo que por definição é artificial.

PS: Este texto foi escrito ao desabrigo de todo e qualquer Acordo Ortográfico e de revisão artificialmente inteligente, e reflecte a opinião pessoal de alguém que como músico, compositor e criador se sente verdadeiramente desafiado (e estimulado) pelas infinitas capacidades da IA.

Imagem do autor, Paulo de Mendonça, gerada por Inteligência Artificial

5 - Novidades do Site

Eis os artigos recentemente publicados no site:

Uma nova era

Esticão! (Correio urgente desde Espanha, no 29 de abril)

Decrescimento: conceito e sua aplicação, do bairro ao território

A urgência em Decrescer 

Inteligência artificial: o novo “deus” da tecnologia

6 - Publicações de interesse para a comunidade decrescentista

Seguem alguns artigos, newsletters e outros sites recomendados:

- European Newsletter do IDN/ International Degrowth Network, de Junho 2025

- Revista 15/15\15

- European Newsletter do IDN/ International Degrowth Network, de Maio 2025

- European Newsletter do IDN/ International Degrowth Network, de Abril 2025

==

E… porque precisamos de sonhar um outro mundo, terminamos com uma canção com letra e música gerada pela IA (tendo por base o artigo do Paulo): Circuitos e Corações

Gostou do artigo? Considere subscrever